“Os meninos ainda podem cantar nas vielas de kandahar”, ressoa uma rouca voz naquele deserto do oriente. E lá, ajoelhado e com um desafinado lamento islâmico, está o Menino do Cemitério a cantar.
Ao longe ele percebe a aproximação de uma mulher. Uma Misteriosa Mulher. Ele curiosamente se aproxima e tenta tecer um diálogo com a forasteira. Quando percebe então que se trata de uma afegã, mas que há muito vive distante de sua terra. Ela trocou o castigante deserto pela neve. Ela mora no Canadá, na parte ocidental do planeta.
O Menino do Cemitério percebe que a Misteriosa Mulher precisa de ajuda. Ela precisa de um guia para chegar a Kandahar. “O que uma mulher tão bela – pois lhe revelou a face, ao retirar o hijab do rosto – busca se aventurando por tão hostil deserto”, pensou o menino.
Eles combinam um preço. O garoto, rejeitado das madrazas onde se preparam guerreiros para a jihad, segue a frente da Misteriosa Mulher. Assaltantes, saqueadores e outros perigos rodavam-lhes no caminho. Mas, seguiam firmes em seus propósitos.
Mas, qual era mesmo o motivo da ida a Kandahar? Perguntou-se o astuto Menino.
- Preciso encontrar minha irmã e salvá-la. Ela não pode mais ficar neste inferno, nesta guerra sem limites. Revelou a mulher.
O propósito do Menino do Cemitério era apenas ganhar alguns dólares e fazer algumas estripulias, como quando encontrou um cadáver em decomposição e assustou a Misteriosa Mulher, que correra em disparada pelo deserto.
Na viagem a mulher não se sente bem e o Menino do Cemitério a leva a um médico.
- Fiquei doente na viagem. Não sei se foi a água do poço ou medo que tive do cadáver ou da violência que vejo em toda parte, até nas brincadeiras das crianças. Disse a mulher ao médico.
O médico não era afegão. Era um afro-americano disfarçado, pois acreditava na luta. Que luta?! Nem ele mesmo saberia responder...
O médico fica intrigado com a presença do menino e avisa à Misteriosa Mulher que ele pode representar um perigo. E aconselha-a a pagá-lo e despedir-se dele.
Ela assim o faz.
- Não entendi muito porque ela não quis mais meus serviços. Talvez tenha me achado fraco para enfrentar os perigos vindouros. Um adulto seria mais seguro. Ou ficou com medo de mim, por causa de alguma coisa que aquele médico falou? Não sei... Falava consigo mesmo o Menino do Cemitério.
- Fui embora, mas antes insisti para ela aceitar um presente: um lindo anel de esmeralda que peguei na mão daquele cadáver, no deserto. Foi tão engraçado ver aquela Misteriosa e bela Mulher correndo feito uma louca e eu atrás apontando para ela o anel do morto. Foi divertido!
- Depois disso tive uma má notícia dela...
A mulher tinha partido com o médico que resolveu lhe ajudar. No caminho conversavam sobre os acontecimentos no país. “Armas são a única coisa moderna no Afeganistão”, disse o médico à ela.
...soube que ela encontrou um acampamento onde médicas voluntárias ajudavam pessoas com os membros decepados pelas bombas. Davam-lhes muletas. Um dos beneficiados conseguiu um disfarce para a Mulher Misteriosa que dizia levar “mil razões para a irmã - que morava em Kandahar - viver”. Ela se juntou a um grupo que seguia em procissão rumo a Kandahar. Era uma festa de casamento...
Antes de seguir com o grupo a Mulher pediu ao médico que proferisse a um gravador de voz algumas palavras de esperança para sua irmã. “A esperança, em situações difíceis, é água, pão e amor”, foi o que pronunciou o médico.
...Mas, algo deu errado. Uma blitz parou o grupo e revistou-os, descobrindo assim a Mulher Misteriosa. Foi o fim! Ela não chegou à Kandahar, nem tão pouco encontrou sua irmã. A água, pão e amor se transformaram em horror! Não há esperança aqui.
- Corta!!! Exclama Arnald, o diretor do curta metragem gravado no Afeganistão.
- Vocês foram belíssimos! Terão um dia de folga. Podem descansar à vontade, só tenham cuidado: a história do nosso filme é bastante verossímil!
Saamiya, que significa “mulher altiva”, a “Mulher Misteriosa” do curta, gostaria de ir a Kandahar para pegar alguns vídeos editados por sua irmã Saalima. Então, Nabi Muhammad, o “médico” e Hizam, que interpretou o “Menino do Cemitério”, se propuseram a acompanhá-la. Afinal, seria mais seguro e eles poderiam passar o texto da seqüência do filme.
No caminho, Saamiya se impressiona com a quantidade de armas nas mãos das pessoas, inclusive de crianças.
- Parece que armas são a única coisa moderna no Afeganistão?! Exclama assustada a atriz.
- Pois é! Responde Nabi Muhammad.
A viagem prossegue sem maiores perigos. Quando de repente, às portas da cidade de Kandahar, eles são surpreendidos por soldados.
- Iremos revistá-los! Grita com cara de poucos amigos um raivoso soldado.
A vistoria começa e um dos soldados encontra o passaporte de Saamiya. O documento é de origem norte-americana e isso poderia gerar problemas. O soldado mais nervoso do grupamento indagou a atriz sobre o motivo da sua ida a Kandahar.
- Preciso pegar alguns vídeos editados com minha irmã Saalima, que mora aí! Disse Saamiya.
- Não sei o que é isso! Rebateu indiferente o soldado.
- Seja moderno, vídeos editados são gravações que passaram por um estúdio e estão prontas para assistir! Respondeu a atriz, com leve ironia.
- Armas são a única coisa moderna no Afeganistão! Disse enfurecido o soldado.
E assim, o curta metragem não pôde recomeçar, e nem tão pouco Saamiya pôde encontrar sua irmã. A água, pão e amor se transformaram em horror! Não há esperança aqui.
Fecham-se, então, as cortinas! Aplausos contagiantes saíram da platéia que lotou o teatro.
Na saída do espetáculo teatral as pessoas comentavam o contexto histórico da peça.
- Você viu?! Estamos no século vinte e um e armas são a única coisa moderna no Afeganistão!
- É mesmo! A água, pão e amor se transformaram em horror! Não há esperança lá.
Ao longe ele percebe a aproximação de uma mulher. Uma Misteriosa Mulher. Ele curiosamente se aproxima e tenta tecer um diálogo com a forasteira. Quando percebe então que se trata de uma afegã, mas que há muito vive distante de sua terra. Ela trocou o castigante deserto pela neve. Ela mora no Canadá, na parte ocidental do planeta.
O Menino do Cemitério percebe que a Misteriosa Mulher precisa de ajuda. Ela precisa de um guia para chegar a Kandahar. “O que uma mulher tão bela – pois lhe revelou a face, ao retirar o hijab do rosto – busca se aventurando por tão hostil deserto”, pensou o menino.
Eles combinam um preço. O garoto, rejeitado das madrazas onde se preparam guerreiros para a jihad, segue a frente da Misteriosa Mulher. Assaltantes, saqueadores e outros perigos rodavam-lhes no caminho. Mas, seguiam firmes em seus propósitos.
Mas, qual era mesmo o motivo da ida a Kandahar? Perguntou-se o astuto Menino.
- Preciso encontrar minha irmã e salvá-la. Ela não pode mais ficar neste inferno, nesta guerra sem limites. Revelou a mulher.
O propósito do Menino do Cemitério era apenas ganhar alguns dólares e fazer algumas estripulias, como quando encontrou um cadáver em decomposição e assustou a Misteriosa Mulher, que correra em disparada pelo deserto.
Na viagem a mulher não se sente bem e o Menino do Cemitério a leva a um médico.
- Fiquei doente na viagem. Não sei se foi a água do poço ou medo que tive do cadáver ou da violência que vejo em toda parte, até nas brincadeiras das crianças. Disse a mulher ao médico.
O médico não era afegão. Era um afro-americano disfarçado, pois acreditava na luta. Que luta?! Nem ele mesmo saberia responder...
O médico fica intrigado com a presença do menino e avisa à Misteriosa Mulher que ele pode representar um perigo. E aconselha-a a pagá-lo e despedir-se dele.
Ela assim o faz.
- Não entendi muito porque ela não quis mais meus serviços. Talvez tenha me achado fraco para enfrentar os perigos vindouros. Um adulto seria mais seguro. Ou ficou com medo de mim, por causa de alguma coisa que aquele médico falou? Não sei... Falava consigo mesmo o Menino do Cemitério.
- Fui embora, mas antes insisti para ela aceitar um presente: um lindo anel de esmeralda que peguei na mão daquele cadáver, no deserto. Foi tão engraçado ver aquela Misteriosa e bela Mulher correndo feito uma louca e eu atrás apontando para ela o anel do morto. Foi divertido!
- Depois disso tive uma má notícia dela...
A mulher tinha partido com o médico que resolveu lhe ajudar. No caminho conversavam sobre os acontecimentos no país. “Armas são a única coisa moderna no Afeganistão”, disse o médico à ela.
...soube que ela encontrou um acampamento onde médicas voluntárias ajudavam pessoas com os membros decepados pelas bombas. Davam-lhes muletas. Um dos beneficiados conseguiu um disfarce para a Mulher Misteriosa que dizia levar “mil razões para a irmã - que morava em Kandahar - viver”. Ela se juntou a um grupo que seguia em procissão rumo a Kandahar. Era uma festa de casamento...
Antes de seguir com o grupo a Mulher pediu ao médico que proferisse a um gravador de voz algumas palavras de esperança para sua irmã. “A esperança, em situações difíceis, é água, pão e amor”, foi o que pronunciou o médico.
...Mas, algo deu errado. Uma blitz parou o grupo e revistou-os, descobrindo assim a Mulher Misteriosa. Foi o fim! Ela não chegou à Kandahar, nem tão pouco encontrou sua irmã. A água, pão e amor se transformaram em horror! Não há esperança aqui.
- Corta!!! Exclama Arnald, o diretor do curta metragem gravado no Afeganistão.
- Vocês foram belíssimos! Terão um dia de folga. Podem descansar à vontade, só tenham cuidado: a história do nosso filme é bastante verossímil!
Saamiya, que significa “mulher altiva”, a “Mulher Misteriosa” do curta, gostaria de ir a Kandahar para pegar alguns vídeos editados por sua irmã Saalima. Então, Nabi Muhammad, o “médico” e Hizam, que interpretou o “Menino do Cemitério”, se propuseram a acompanhá-la. Afinal, seria mais seguro e eles poderiam passar o texto da seqüência do filme.
No caminho, Saamiya se impressiona com a quantidade de armas nas mãos das pessoas, inclusive de crianças.
- Parece que armas são a única coisa moderna no Afeganistão?! Exclama assustada a atriz.
- Pois é! Responde Nabi Muhammad.
A viagem prossegue sem maiores perigos. Quando de repente, às portas da cidade de Kandahar, eles são surpreendidos por soldados.
- Iremos revistá-los! Grita com cara de poucos amigos um raivoso soldado.
A vistoria começa e um dos soldados encontra o passaporte de Saamiya. O documento é de origem norte-americana e isso poderia gerar problemas. O soldado mais nervoso do grupamento indagou a atriz sobre o motivo da sua ida a Kandahar.
- Preciso pegar alguns vídeos editados com minha irmã Saalima, que mora aí! Disse Saamiya.
- Não sei o que é isso! Rebateu indiferente o soldado.
- Seja moderno, vídeos editados são gravações que passaram por um estúdio e estão prontas para assistir! Respondeu a atriz, com leve ironia.
- Armas são a única coisa moderna no Afeganistão! Disse enfurecido o soldado.
E assim, o curta metragem não pôde recomeçar, e nem tão pouco Saamiya pôde encontrar sua irmã. A água, pão e amor se transformaram em horror! Não há esperança aqui.
Fecham-se, então, as cortinas! Aplausos contagiantes saíram da platéia que lotou o teatro.
Na saída do espetáculo teatral as pessoas comentavam o contexto histórico da peça.
- Você viu?! Estamos no século vinte e um e armas são a única coisa moderna no Afeganistão!
- É mesmo! A água, pão e amor se transformaram em horror! Não há esperança lá.
Fotos: Europa Filmes